O passar do tempo deixa marcas e impõe desafios pessoais e até mesmo financeiros. O maior deles: ter saúde. E até nisso os novos velhos surpreendem.
Autonomia e independência. Ter saúde depois dos 60 ganhou novo significado para as pessoas e para as famílias. Acordar de manhã e não conseguir se levantar sozinha: a aposentada Josefa Matos tem se esforçado para vencer a rotina de limitações: “O mais difícil é não andar. Tenho mais vontade de andar e não posso. Mas do resto tudo eu vou vencendo”, afirma a aposentada Josefa Matos.
O tratamento é lento, exige paciência. Ela ainda se recupera da retirada de um tumor na medula. Como subir e descer quatro lances de escada depois de uma cirurgia e sem poder andar? Era o drama de Dona Josefa, que morava em um prédio, sem elevador. Mas como resolver esse problema numa família de pouco dinheiro? Só há uma alternativa, dizem os filhos: fazer qualquer sacrifício para ajudar no tratamento.
A primeira providência foi mudar de endereço. Hoje ela mora em um prédio com elevador, tem acompanhantes e fisioterapeuta. As despesas são divididas entre os dez filhos.
“Mesmo com esse baque financeiro, conseguimos ficar mais unidos. Acho que isso ajudou na recuperação dela”, elogia a administradora Luciana Matos.
“Nossa mãe é uma guerreira. Ninguém imagina uma mãe numa cadeira de rodas. A luta é administrar a cabeça, isso é complicado”, diz o funcionário público José Roberto Matos.O empenho dos filhos tem sido decisivo. Dona Josefa melhora a cada dia: “Se eu não tivesse esses filhos todos, já tinha morrido. Quem vinha tomar conta? Fazer tanta coisa para mim?”.
A ajuda da família não é tudo, diz o doutor Wilson Jacob. Ele recomenda mais atenção à saúde antes de se tornar um idoso. Envelhecer, de acordo com o professor, é uma tarefa para a vida toda.
“Podemos nos ocupar, preparar este envelhecimento, ao contrário do que fizeram nossos antecessores, que era sempre o de temer o envelhecimento ou buscar estratégias fantasiosas de reverter o processo de envelhecimento”, aponta o geriatra Wilson Jacob Filho.
A partir dos 60 anos, a probabilidade de ter hipertensão é de 50%. Diabetes: 20%. Aos 70, é grande o número de derrames e de fraturas causadas pela osteoporose não tratada. Aos 80, aumenta a incidência de doenças como o Mal de Alzheimer.
Quem não se cuida, sofre mais depois dos 80. “Foi aquele diabetes que começou aos 50 e mal cuidado provocou complicações aos 80. Aquela hipertensão que começou aos 40 e mal cuidada provocou complicações”, diz o geriatra Wilson Jacob Filho.
Os grandes vilões do envelhecimento têm um apelido: os 5 Is: “imbalance”: perda de equilíbrio, em inglês, “incontinências”, “imobilidade”, “incapacidade progressiva de raciocínio” e a “iatrogenia”.
“A última é consequência do ato de prescrever ou de indicar exames ou do uso indiscriminado de medicamentos ou de técnicas que são propaladas boca a boca e que não passam por um crivo científico adequado”, explica o geriatra Wilson Jacob Filho.
Se a maioria das doenças é crônica, um dos caminhos é combatê-las todos os dias. É bom, por exemplo, exercitar a memória, que começa a ser perdida bem cedo a partir dos 20 anos.
Esquecer o nome de uma pessoa conhecida, não se lembrar onde deixou a chave do carro são sintomas do envelhecimento. Mas há como evitar esse processo de perda da memória que faz a gente esquecer das coisas. Um grupo tenta resolver esses problemas com exercício que puxam pelo raciocínio, na aula de neoróbica.
Números, cálculos, jogo de damas, caça-palavras. O que parece uma brincadeira, aqui, é remédio.
“O jogo de palavras trabalha a parte frontal esquerda do cérebro, onde há algumas estruturas responsáveis pelo raciocínio lógico e pela memória semântica e linguagem”, aponta a neuropsicóloga Adriana Monzambe.
A aposentada Elzi Dias Alessandrini está gostando dos resultados: “Esses exercícios já modificaram muito minha capacidade de memorizar as coisas. Eu tenho muitos netos também e eu preciso ter a memória mais ou menos em dia. Não é só a memória, os assuntos também. Então a gente fica com tudo isso em dia para dialogar com os netos e me sentir à vontade entre eles”.
E a depressão? Como combater essa doença que também costuma maltratar os idosos?
“Quanto mais conversar melhor. Com amigos e se possível fazer novos amigos. O isolamento é condenável. A gente precisa trabalhar preventivamente nessa fase para que a depressão não entre, porque ela é sorrateira”, aponta a gerontóloga Cristiane Felipe.
O que dizer de uma centenária cheia de alegria e disposição?
“Eu gosto dos exercícios. Faz as pernas de uma vez, depois faz a outra. Nos braços, até maromba eu faço”, avisa Dona Cano, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia.
São três sessões de Pilates por semana. Não parece, mas Dona Canô já fez 102 anos. Com uma saúde de dar inveja. Uma lucidez…
“Meu conselho para viver muito é não ficar se indignando por tudo. Qualquer coisa se revolta. Aí já vai perdendo a saúde. Qualquer coisa que abala o coração a saúde sente”, opina Dona Cano.
Se engana quem pensa que Dona Canô come que nem passarinho. Nada de regime. Fechar a boca? De jeito nenhum.
“O prato que eu mais gosto é feijoada”, diz.
E de brincadeira, acabei pregando uma peça nela:
“Mingau, não, que é isso. Mingau só quando eu não tiver mais cabeça. Mingau é coisa de velho e de velho doente, o que é pior”, rebate Dona Cano, mãe de Caetano Veloso e Maria Bethânia.
Veja aqui a matéria veiculada no telejornal Bom Dia Brasil.
Publicado em 23/10/2009
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